A passagem de ano nos remete a
sensação mudança, de novas atitudes, novas posturas e principalmente de
esperança de que dias melhores virão. No extremo oriente, 2013 trará, de fato,
muitas novidades: os quatro países da região - Coréia do Sul, Coréia do Norte,
República Popular da China e Japão - passaram por mudanças recentes na chefia
de Estado.
A Coréia do Sul passou por recente
troca no comando do governo e, em fevereiro, assume Park Geun-Hye, filha do General Park Chung-Hee, ditador que comandou o país de
1961 até sua morte em 1979. A recém-eleita Park tem 60 anos e será a primeira
mulher a governar o país. Além disso, pertence ao partido conservador
Saenuri, que já comanda o país desde a última eleição presidencial, por meio de
Lee Myung-Bak.
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Park Geun-Hye, primeira mulher a ser presidente da
Coréia do Sul. Eleita no último mês, ela iniciará suas atividades em Fevereiro.
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No lado norte do paralelo 38, a
mudança de liderança aconteceu no final de 2011, quando morreu o "querido
líder" Kim Jong-Il e
assumiu seu filho, o jovem Kim Jong-Un. Com apenas 28 ou 29 anos (não se
sabe a idade ao certo), Kim Jong-Un se tornou o mais jovem chefe-de-Estado do
planeta e, desde o começo, teve que enfrentar oposição de uma parte das forças
armadas norte-coreanas que preferiam alguém mais linha-dura para assumir o
comando do país comunista. Além disso, o novo Líder Supremo tem que lidar com
as dificuldades de manter um projeto nuclear a contra-gosto de quase todo o
planeta.
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Kim Jong-Un, filho mais jovem de Kim Jong-Il
assumiu o poder na Coréia do Norte em Dezembro de 2011. Acima, ele discursa
para a população por ocasião do último ano novo.
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No Japão, Shinzo Abe ganha nova chance como premiê,
depois de um ano de mandato entre Setembro de 2006 e Setembro de 2007. Abe é do
partido Liberal Democrata (LDP), de matriz ideológica conservadora e que mais
tempo ficou no poder desde a instauração da democracia japonesa. A mudança ocorre
no meio de uma crise bilateral com a China pela disputa de algumas ilhas entre
os dois países, chamadas de Diaoyu pelos chineses e Senkaku pelos japoneses.
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Após a vitória de seu partido nas eleições
parlamentares no último mês, Shinzo Abe assume novamente o posto de
primeiro-ministro do Japão. Ele já havia ocupado o posto entre 2006 e 2007.
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Em Março, Xi Jinping deverá ser o novo Chefe-de-Estado
da República Popular da China. A mudança ocorre após 10 anos de governo de Hu
Jintao, durante os quais a China assumiu o posto de segunda maior economia e de
maior exportador do planeta. Xi vem da facção dos chamados
"príncipes" do Partido Comunista Chinês, filhos de ex-membros
importantes do partido ou que participaram da Guerra Civil Chinesa, que colocou
os comunistas no poder em 1949. No caso de Xi, ele é filho de Xi Zhongxun, ex-vice-premiê e guerrilheiro que
lutou na expulsão dos japoneses da China e na Guerra Civil.
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Xi Jinping deve assumir a presidência da China em
Março, por apontamento do Partido Comunista Chinês.
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As mudanças nas cúpulas de poder
afetam as duas principais focos de tensão na região: o conflito entre as
Coréias do Norte e do Sul e o recente acirramento da rivalidade entre Japão e
China. Enquanto na península as esperanças são renovadas com a troca de comando
e as projeções futuras são positivas, a relação entre Tóquio e Pequim deve se
tornar cada vez mais ríspida dado o perfil dos novos chefes-de-Estado.
Nas Coréias, os discursos mostram uma
convergência para a melhora. Mesmo antes de assumir, a futura presidente Park
tem defendido um maior diálogo com os vizinhos do norte e de um maior aporte
financeiro de ajuda humanitária vindo de Seul. Claro, que as maiores
quantidades de doações devem ser condicionadas à restrições ou ao término do
programa nuclear norte-coreano, mas a disposição para o diálogo já é uma
evolução em comparação ao período Lee Myung-Bak que lidou de forma dura com
Pyongyang, cortando boa parte da ajuda financeira ao norte e se fechando cada
vez mais para o diálogo com o vizinho.
Não é segredo para ninguém que a
Coréia do Norte passa por dificuldades sociais, principalmente por causa de
dois grandes déficits: de energia e de alimentos, assuntos aparentemente
ignorados pelo "Querido Líder" Kim Jong-Il, que governou o país
socialista de 1994 até sua morte em Dezembro de 2011. Contudo, em um discurso
surpreendente neste ano novo, o atual comandante dos norte-coreanos, Kim
Jong-Un, disse que a prioridade de 2013 é aumentar a qualidade de vida de sua
população. E ainda defendeu, no mesmo discurso, a paz e a reconciliação com
Seul, chegando até a falar em reunificação, uma palavra que é quase um tabu na
península coreana. A única nota negativa é a promessa de modernização do
exército, ainda que sem citar armamentos atômicos.
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Mísseis norte-coreanos em parada militar. O
programa nuclear norte-coreano é um dos cernes da permanente crise entre norte
e sul.
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Observando, portanto, o comportamento
dos novos líderes coreanos, devemos esperar uma melhora em relação ao período
anterior. Kim Jong-Il e Lee Myung-Bak se trataram com muito mais rispidez e
quase chegaram a guerra de fato em alguns momentos, como em 2010, quando a Coréia do Norte bombardeou uma
ilha ocupada por sul-coreanos, matando duas pessoas. Contudo, a
melhoria esperada das relações durante os governos de Park e Kim Jong-Un deve
acontecer de forma gradual. A retomada do envio de ajuda ocorrerá aos poucos,
pois as contrapartidas oferecidas por Pyongyang também irão progredir de forma
lenta. É improvável o desmantelamento do programa nuclear no curto prazo, por
exemplo.
Já no Japão, a volta dos
conservadores ao poder e, principalmente, a figura de Shinzo Abe aumenta as
tensões regionais com a vizinha China. Mesmo antes, da volta do LDP ao poder, a
disputa pelas ilhas Diaoyu/Senkaku já se agravaram quando o governo japonês
anunciou a compra da ilhas que são propriedade de uma família japonesa. A China
criticou duramente a ação e chamou-a de ilegal. O novo
primeiro-ministro já declarou ser a favor de reformar a atual constituição
e recriar forças militares para o Japão - desde o término da Segunda Guerra
Mundial, o país não possuí forças armadas oficialmente e tem sua defesa
garantida pelos Estados Unidos. O discurso é claro, pode não ter relação direta
com a disputa pelas ilhas, mas sinaliza que a vontade do novo governo é um
Japão mais agressivo.
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Mapa do jornal inglês The Guardian que ilustra a
disputa pelas ilhas Diaoyu/Senkaku.
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Xi Jinping, por sua vez, não tem
nenhum histórico de ser um nacionalista extremado. Não mais do que a média de
seus compatriotas ou do que ex-presidente Hu Jintao. Mas ainda assim é um novo
governante - que precisa mostrar serviço para seus pares do partido comunista -
de um país que deve assumir o posto de líder do sistema internacional em
no máximo 50 anos. É provável, portanto, que Xi reaja com mais força do que seu
antecessor reagiria à um movimento nacionalista dos japoneses, podendo provocar
um conflito bélico. Como a China tem outras disputas por ilhas na região e no
sudeste asiático, é pouco crível que um primeiro movimento de agressão venha de
Pequim, apenas uma reação dura. Mas com Shinzo Abe no governo do Japão, não
difícil crer que o estopim possa vir de Tóquio.
De Dezembro de 2011 à Março de 2013,
num período de apenas 1 ano e 3 meses, vimos os quatro países do nordeste
asiático trocarem seus comandantes, dois de maneira democrática, um de maneira
'semi-democrática' e um de maneira totalmente autoritária. Independente, porém,
dos regimes políticos de seus países, os perfis individuais de cada um que
determinarão como se dará a geopolítica da região nos próximos anos. Olhando o
que cada um vêm dizendo em discursos e as condições em que assumem, pudemos
tirar perspectivas das tensões da região.
As Coréias parecem caminhar para uma
ligeira melhora, mas os discursos de Park e Kim Jong-Un precisam ser colocados
em prática, para que não sejam meras promessas políticas. Todos têm a ganhar
com isso, principalmente a população norte-coreana que vê a possibilidade de
melhorar suas condições de vida com a ajuda externa. Já o conflito - por
enquanto apenas diplomático - entre China e Japão, alça a região a um
nível de tensão que a coloca entre as mais perigosas do mundo, já que em
nenhuma outra região, dois países tão grandes estão em choque. É importante
lembrar que, caso haja um embate bélico entre Japão e China, os Estados Unidos
entram quase que automaticamente na disputa, já que por meio de tratado
internacional têm a obrigação de garantir a segurança japonesa desde a Segunda
Guerra Mundial, em troca de Tóquio aceitar restrições militares rígidas.
Portanto, Abe e Xi Jinping vão ter que abrandar os discursos e a prática em
nome de maior tranquilidade não só para a região, mas para todo o planeta. Por
incrível que pareça, o conflito coreano parece não ser o principal problema de
segurança do Leste da Ásia em 2013.