segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

China, Japão e Coréias: Novas mudanças, novos rumos


A passagem de ano nos remete a sensação mudança, de novas atitudes, novas posturas e principalmente de esperança de que dias melhores virão. No extremo oriente, 2013 trará, de fato, muitas novidades: os quatro países da região - Coréia do Sul, Coréia do Norte, República Popular da China e Japão - passaram por mudanças recentes na chefia de Estado.

A Coréia do Sul passou por recente troca no comando do governo e, em fevereiro, assume Park Geun-Hye, filha do General Park Chung-Hee, ditador que comandou o país de 1961 até sua morte em 1979.  A recém-eleita Park tem 60 anos e será a primeira mulher a governar o país. Além disso, pertence ao partido conservador Saenuri, que já comanda o país desde a última eleição presidencial, por meio de Lee Myung-Bak.



Park Geun-Hye, primeira mulher a ser presidente da Coréia do Sul. Eleita no último mês, ela iniciará suas atividades em Fevereiro.
No lado norte do paralelo 38, a mudança de liderança aconteceu no final de 2011, quando morreu o "querido líder" Kim Jong-Il e assumiu seu filho, o jovem Kim Jong-Un. Com apenas 28 ou 29 anos (não se sabe a idade ao certo), Kim Jong-Un se tornou o mais jovem chefe-de-Estado do planeta e, desde o começo, teve que enfrentar oposição de uma parte das forças armadas norte-coreanas que preferiam alguém mais linha-dura para assumir o comando do país comunista. Além disso, o novo Líder Supremo tem que lidar com as dificuldades de manter um projeto nuclear a contra-gosto de quase todo o planeta.

Kim Jong-Un, filho mais jovem de Kim Jong-Il assumiu o poder na Coréia do Norte em Dezembro de 2011. Acima, ele discursa para a população por ocasião do último ano novo.
No Japão, Shinzo Abe ganha nova chance como premiê, depois de um ano de mandato entre Setembro de 2006 e Setembro de 2007. Abe é do partido Liberal Democrata (LDP), de matriz ideológica conservadora e que mais tempo ficou no poder desde a instauração da democracia japonesa. A mudança ocorre no meio de uma crise bilateral com a China pela disputa de algumas ilhas entre os dois países, chamadas de Diaoyu pelos chineses e Senkaku pelos japoneses.

Após a vitória de seu partido nas eleições parlamentares no último mês, Shinzo Abe assume novamente o posto de primeiro-ministro do Japão. Ele já havia ocupado o posto entre 2006 e 2007.
Em Março, Xi Jinping deverá ser o novo Chefe-de-Estado da República Popular da China. A mudança ocorre após 10 anos de governo de Hu Jintao, durante os quais a China assumiu o posto de segunda maior economia e de maior exportador do planeta. Xi vem da facção dos chamados "príncipes" do Partido Comunista Chinês, filhos de ex-membros importantes do partido ou que participaram da Guerra Civil Chinesa, que colocou os comunistas no poder em 1949. No caso de Xi, ele é filho de Xi Zhongxun, ex-vice-premiê e guerrilheiro que lutou na expulsão dos japoneses da China e na Guerra Civil.

Xi Jinping deve assumir a presidência da China em Março, por apontamento do Partido Comunista Chinês.
As mudanças nas cúpulas de poder afetam as duas principais focos de tensão na região: o conflito entre as Coréias do Norte e do Sul e o recente acirramento da rivalidade entre Japão e China. Enquanto na península as esperanças são renovadas com a troca de comando e as projeções futuras são positivas, a relação entre Tóquio e Pequim deve se tornar cada vez mais ríspida dado o perfil dos novos chefes-de-Estado.

Nas Coréias, os discursos mostram uma convergência para a melhora. Mesmo antes de assumir, a futura presidente Park tem defendido um maior diálogo com os vizinhos do norte e de um maior aporte financeiro de ajuda humanitária vindo de Seul. Claro, que as maiores quantidades de doações devem ser condicionadas à restrições ou ao término do programa nuclear norte-coreano, mas a disposição para o diálogo já é uma evolução em comparação ao período Lee Myung-Bak que lidou de forma dura com Pyongyang, cortando boa parte da ajuda financeira ao norte e se fechando cada vez mais para o diálogo com o vizinho.

Não é segredo para ninguém que a Coréia do Norte passa por dificuldades sociais, principalmente por causa de dois grandes déficits: de energia e de alimentos, assuntos aparentemente ignorados pelo "Querido Líder" Kim Jong-Il, que governou o país socialista de 1994 até sua morte em Dezembro de 2011. Contudo, em um discurso surpreendente neste ano novo, o atual comandante dos norte-coreanos, Kim Jong-Un, disse que a prioridade de 2013 é aumentar a qualidade de vida de sua população. E ainda defendeu, no mesmo discurso, a paz e a reconciliação com Seul, chegando até a falar em reunificação, uma palavra que é quase um tabu na península coreana. A única nota negativa é a promessa de modernização do exército, ainda que sem citar armamentos atômicos.

Mísseis norte-coreanos em parada militar. O programa nuclear norte-coreano é um dos cernes da permanente crise entre norte e sul.

Observando, portanto, o comportamento dos novos líderes coreanos, devemos esperar uma melhora em relação ao período anterior. Kim Jong-Il e Lee Myung-Bak se trataram com muito mais rispidez e quase chegaram a guerra de fato em alguns momentos, como em 2010, quando a Coréia do Norte bombardeou uma ilha ocupada por sul-coreanos, matando duas pessoas. Contudo, a melhoria esperada das relações durante os governos de Park e Kim Jong-Un deve acontecer de forma gradual. A retomada do envio de ajuda ocorrerá aos poucos, pois as contrapartidas oferecidas por Pyongyang também irão progredir de forma lenta. É improvável o desmantelamento do programa nuclear no curto prazo, por exemplo.

Já no Japão, a volta dos conservadores ao poder e, principalmente, a figura de Shinzo Abe aumenta as tensões regionais com a vizinha China. Mesmo antes, da volta do LDP ao poder, a disputa pelas ilhas Diaoyu/Senkaku já se agravaram quando o governo japonês anunciou a compra da ilhas que são propriedade de uma família japonesa. A China criticou duramente a ação e chamou-a de ilegal. O novo primeiro-ministro já declarou ser a favor de reformar a atual constituição e recriar forças militares para o Japão - desde o término da Segunda Guerra Mundial, o país não possuí forças armadas oficialmente e tem sua defesa garantida pelos Estados Unidos. O discurso é claro, pode não ter relação direta com a disputa pelas ilhas, mas sinaliza que a vontade do novo governo é um Japão mais agressivo.

Mapa do jornal inglês The Guardian que ilustra a disputa pelas ilhas Diaoyu/Senkaku.

Xi Jinping, por sua vez, não tem nenhum histórico de ser um nacionalista extremado. Não mais do que a média de seus compatriotas ou do que ex-presidente Hu Jintao. Mas ainda assim é um novo governante - que precisa mostrar serviço para seus pares do partido comunista - de um país que deve assumir o posto de líder do sistema internacional em no máximo 50 anos. É provável, portanto, que Xi reaja com mais força do que seu antecessor reagiria à um movimento nacionalista dos japoneses, podendo provocar um conflito bélico. Como a China tem outras disputas por ilhas na região e no sudeste asiático, é pouco crível que um primeiro movimento de agressão venha de Pequim, apenas uma reação dura. Mas com Shinzo Abe no governo do Japão, não difícil crer que o estopim possa vir de Tóquio.

De Dezembro de 2011 à Março de 2013, num período de apenas 1 ano e 3 meses, vimos os quatro países do nordeste asiático trocarem seus comandantes, dois de maneira democrática, um de maneira 'semi-democrática' e um de maneira totalmente autoritária. Independente, porém, dos regimes políticos de seus países, os perfis individuais de cada um que determinarão como se dará a geopolítica da região nos próximos anos. Olhando o que cada um vêm dizendo em discursos e as condições em que assumem, pudemos tirar perspectivas das tensões da região.

As Coréias parecem caminhar para uma ligeira melhora, mas os discursos de Park e Kim Jong-Un precisam ser colocados em prática, para que não sejam meras promessas políticas. Todos têm a ganhar com isso, principalmente a população norte-coreana que vê a possibilidade de melhorar suas condições de vida com a ajuda externa. Já o conflito - por enquanto apenas diplomático -  entre China e Japão, alça a região a um nível de tensão que a coloca entre as mais perigosas do mundo, já que em nenhuma outra região, dois países tão grandes estão em choque. É importante lembrar que, caso haja um embate bélico entre Japão e China, os Estados Unidos entram quase que automaticamente na disputa, já que por meio de tratado internacional têm a obrigação de garantir a segurança japonesa desde a Segunda Guerra Mundial, em troca de Tóquio aceitar restrições militares rígidas. Portanto, Abe e Xi Jinping vão ter que abrandar os discursos e a prática em nome de maior tranquilidade não só para a região, mas para todo o planeta. Por incrível que pareça, o conflito coreano parece não ser o principal problema de segurança do Leste da Ásia em 2013.